quinta-feira, 6 de junho de 2013

Depoimento 1 - Professor Dionísio

Olá a todos! Bom, as experiências de leitura que me marcaram aconteceram quando estava cursando Letras na Universidade. Infelizmente, meus pais não me incentivavam a ler quando era pequeno e o pouco que eu lia vinha através de  motivações  de professores ou colegas de sala. Sendo assim, gostaria de relatar um romance que eu li de uma escritora norte-americana chamada Toni Morrison. O nome do romance é O olho mais azul, The Bluest Eye. Nossa, eu nunca havia lido um livro e chorado tanto na minha vida como este. Foi uma experiência muito diferente de leituras anteriores que fiz, talvez porque o livro falasse de um contexto de desigualdade racial com o qual eu me identifiquei. Trata-se de um menina negra chamada Pecola. Ela sofre racismo até mesmo de outras crianças negras em sua escola justamente por ter a pele mais escura. Seus pais, igualmente negros, não a amam e a todo momento utilizam de estereótipos para menosprezá-la. Pecola não tem referências negras para se espelhar e, por isso, sonha em ter olhos azuis (conceito de beleza vigente nos Estados Unidos durante a década de 40), uma boneca branca e uma caneca com a Shirley Temple estampada. É uma tragédia familiar - Pecola fica grávida do pai e enlouquece no final do enredo - que infelizmente representa não só o cenário norte-americano, mas também o brasileiro. Gostei de ter os meus sentimentos revirados e de ser colocado em diferentes lugares  para poder compreender a diferença. Lembro-me que após a leitura, meu grupo e eu tivemos que apresentar em forma de seminário uma análise do romance para os outros alunos. Foi muito bom, porque pudemos questionar padrão de beleza, desigualdade étnico-racial, desigualdade social e o papel da literatura enquanto arte. Ás vezes eu tento fazer com que os meus alunos também sejam provocados pelas leituras que eles estão realizando, ao relacionar o texto trabalhado com a vida deles, observando, é claro, a faixa etária  e o contexto deles. Em sala de aula, sinto que a literatura pode libertar os meus alunos do ramerrão da vida cotidiana, tornando-os mais críticos, reflexivos e sábios em relação às coisas da vida. Tal como pontuou Antonio Cândido, também acredito na literatura como um bem necessário ao indivíduo justamente por encontrar nela caminhos/modos/formas de humanização: "A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante". 
Também concordo com Nina Horta quando ela diz que deixou de viver experiências concretas para poder vê-las ou percebê-las na leitura. Eu também faço isso muitas vezes, deixo de sair ou ver pessoas para poder ficar lendo. Acho isso um exercício bom para equilibrar o nosso corpo, preso nesta sociedade capitalista, de consumo desenfreado e de compressão espaço-temporal, com uma mente pensante, reflexiva, em transformação.

2 comentários:

  1. Olá Dionísio. Parabéns pelo blog. Além de ser um espaço propício para discutir a questão da leitura e escrita, acredito que um ponto importante a ressaltar é a questão do seu depoimento, pois penso que ele sirva de incentivo para quem visitar o blog.

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